Taxa de desemprego entre mulheres indígenas é de 12,5%, superior à média da população brasileira
Por Beatriz de Oliveira, do Nós, mulheres da periferia
As mulheres indígenas enfrentam múltiplas barreiras para acessar o mercado de trabalho. Escolaridade, localização e desigualdades de raça e gênero são algumas delas, conforme aponta Janaina Feijó, economista e pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV-IBRE).
Para esta reportagem, a pesquisadora compilou dados recentes – enviados à equipe – que mostram o cenário atual de acesso de mulheres indígenas ao mercado de trabalho. Os dados foram coletados a partir da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) do primeiro trimestre de 2024.
Janaína Feijó explica que as mulheres indígenas representam 0,3% do total da população em idade ativa, ou seja, 14 anos ou mais. Isso corresponde a cerca de 441 mil mulheres, a maior parte delas localizadas nas regiões Norte e Nordeste.
“Essas regiões são menos dinâmicas economicamente, o que dificulta ainda mais a inserção no mercado de trabalho”, pontua.
A taxa de participação no mercado de trabalho entre as mulheres indígenas é a mais baixa. Esse índice compara o total de pessoas em idade ativa com a quantidade que está de fato trabalhando. Para elas, essa taxa é de 46,3%, enquanto para mulheres negras e brancas é maior do que 50% e para os homens é superior a 70%.
Outra barreira para o acesso desse grupo ao mercado de trabalho é a escolaridade. As mulheres indígenas representam apenas 0,5% das estudantes universitárias do Brasil, segundo levantamento de 2019 feito pelo portal Gênero e Número.
“Nós precisamos estar um passo à frente”
Tainan Kumaruara é da aldeia Muruary, do Baixo Tapajós, em Santarém (PA), é formada em Administração e Contabilidade. Ela trabalha com projetos eventuais nesta área e atualmente tem como o ofício principal o artesanato, além de atuar na formação de mulheres em empreendedorismo e finanças.
“Tenho 17 anos de carteira assinada, sempre trabalhei na parte administrativa, liderando equipes nas empresas onde passei. Mas conquistar esse espaço foi muito difícil, porque tive que lidar com o preconceito institucional”, conta Tainan.
Sobre o acesso de mulheres indígenas ao universo corporativo, ela diz: “Nós, mulheres indígenas, precisamos estar um passo à frente dos outros porque somos vistas com outros olhos”.
Durante a universidade, Tainan enfrentou desafios e preconceitos por ser indígena. “O sistema é estruturado para cometer o racismo institucional. Recebemos muitas críticas dos professores, acadêmicos e colegas”, conta.
Na busca pela colocação no mercado de trabalho, o preconceito permanece. Tainan menciona muitos indígenas omitem sua etnia para “serem vistos no mesmo patamar que os outros, que os brancos”.
Mesmo quando conseguem ingressar no universo corporativo, os desafios persistem. “Não conseguimos estar nesses espaços de trabalho com as nossas pinturas e adereços, porque somos questionados a todo tempo”.
Tainan aponta ainda que para conquistar esses espaços, é necessário deixar de lado alguns costumes e a vivência da espiritualidade para se adaptar à rotina empresarial. “Sem contar que tem a família, os filhos, isso pesa bastante. Então, acessar esses espaços vêm com uma carga dobrada quando se é mulher indígena”.
Desemprego e informalidade
As barreiras para o acesso ao mercado de trabalho refletem-se nos dados: a taxa de desemprego entre mulheres indígenas é de 12,5%. Esse índice compreende aquelas pessoas que estão em busca de um posto de trabalho. Janaína explica que, quando esse índice alcança os dois dígitos, o cenário é preocupante.
“Mesmo que nas culturas indígenas possa haver a decisão de não entrar no mercado de trabalho, uma taxa de desemprego elevada indica que uma parte da população indigena está procurando emprego e não encontra”, pontua a pesquisadora.
A taxa de desemprego do país é de 7,9%. Para mulheres negras é de 11,7%; para mulheres brancas, 7,5%; homens negros, 7,4%, homens indígenas, 8,6% e homens brancos, 5,2%.
Outro dado preocupante analisado por Janaína Feijó é o da informalidade. Metade das mulheres indígenas que estão ocupadas fazem parte do mercado informal, a maior taxa de todos os grupos analisados, seguida pelos homens indígenas (49,5%). No Brasil, como um todo, esse índice é próximo a 40%.
“O mercado de trabalho formal é considerado melhor por garantir direitos à mulher, como a licença maternidade e a previdência. Então, espera-se que a economia gere esses postos de trabalho”, pontua.
A pesquisada afirma que fatores como demandas domésticas e maternidade influenciam na entrada de mulheres no mercado informal, por permitir maior flexibilidade de horários.
Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), mostram que, em 2019, foram contratados 3.094 profissionais indígenas com carteira assinada, sendo que a área de enfermagem foi a que mais contratou.
Para Janaína, o caminho para maior inserção de mulheres indígenas no mercado de trabalho formal passa pela oferta de programas de capacitação e requalificação. Outra frente é o incentivo ao empreendedorismo dessas mulheres, que podem se formalizar através da modalidade empresarial simplificada – Microempreendedor Individual (MEI) – e garantir direitos, como a aposentadoria.